Na verdade, muita gente que diariamente busca informar-se talvez faça essa pergunta de outro jeito: “que p*… é essa?” Não há outras expressões senão essas para traduzir o espanto que pessoas minimamente letradas que assinam ou compram jornais, impressos ou online, ou que buscam sites, portais e blogs, procurando informação e não (apenas) entretenimento, sentem diante da avalanche de erros que tem invadido todos os dias as notícias.
Durante um fórum de jornalismo realizado em outubro deste ano, em São Paulo, pelo canal de TV fechado Globo News e pela revista Piauí, praticamente todos os participantes entrevistados repetiam em uníssono, ao referirem-se à tão debatida crise dos jornais ou do jornalismo: sempre haverá lugar nos veículos noticiosos para os bons textos, o texto bem construído e com o máximo de precisão e informação sobre o fato noticiado ou abordado. Para textos bons, sempre haverá leitor, asseguravam. Entretanto, diante da natureza de determinadas notícias publicadas para atrair os leitores menos interessados em informação e sedentos de detalhes sórdidos da intimidade alheia, e, principalmente, diante de tantas notícias com tantos erros, não parece estar havendo exatamente o contrário? Uma espiada rápida diária em sites locais e nacionais parece provar o oposto do lugar assegurado aos bons textos: para o texto ruim sempre haverá espaço.
REVÓLVER
É importante esclarecer que quando se fala em bons textos no jornalismo não se pede que jornalistas sejam literatos. Jornalismo não é literatura e ninguém está se queixando da falta de beleza. A cobrança mínima que se faz a alguém que escolhe ser jornalista voluntariamente, já que não lhe colocaram um revólver contra a cabeça para que adotasse essa profissão e desconhece-se casos de famílias que ameaçaram seus rebentos de deserdá-los, caso não se tornassem jornalistas, é que saiba usar a gramática e a língua do país onde vive. Uma vez atendidas essas duas condições obrigatórias, espera-se de um jornalista que seja responsável ao apurar detalhadamente os dados do fato que irá noticiar e que tenha a capacidade de contar uma história ou explicar um fenômeno com absoluta clareza.
Levando-se em conta os absurdos que qualquer leitor assíduo de notícias vê diariamente, a impressão que se tem é que os jornalistas dotados dessas capacidades estão em extinção e que, no ritmo no qual o abuso de erros vem se dando, o jornalismo, se quiser sobreviver, vai ter que se reproduzir em cativeiro. Qual o leitor, do tipo que importa e interessa aos anunciantes dos grandes veículos, vai querer gastar seu tempo e dinheiro para ler majoritariamente textos mal escritos e borbulhando de erros de Língua Portuguesa? A qualidade da escrita escorre pela vala, sobretudo nas plataformas online dos veículos. As explicações possíveis são várias. A plataforma online exige atualização contínua, está submetida à histeria da pressa no grau máximo, pois busca-se vencer a concorrência dando furos quanto à publicação das notícias, e contratam principalmente estagiários que muitas vezes ainda não têm noção mínima do assunto sobre o qual estão escrevendo.
PREGUIÇA
E se tudo isso fosse pouco, uma revelação assustadora: a maioria dos estudantes de Jornalismo não lê livros, tem um repertório literário abaixo do sofrível e, embora pareça inacreditável, não lê jornais nem consome informação. Como, num cenário marcado por essa preguiça intelectual, pode-se queixar da falta de leitores? O leitor de notícias é, acima de tudo, um cliente que precisa e quer informação correta, clara e útil. Se não for por isso, por que ele vai comprá-las? Se é para ler qualquer coisa, o blog do vizinho até que conta bem as coisas do bairro e faz umas piadinhas. E é de graça.
* Malu Fontes é jornalista e professora de Jornalismo da Ufba
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