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Gilberto Costa – Repórter da Agência Brasil

A esperança de vida e as condições de saúde dos trabalhadores rurais não justificam idade inferior para obter a aposentadoria na zona rural. Cerca de nove em cada dez aposentadorias rurais (87%) foram concedidas por via judicial. Há mais benefícios pagos nas áreas rurais do que a população residente em idade de receber aposentadoria.

As informações são do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério da Economia, e foram obtidas em estudos publicados no semestre passado, com dados secundários da Secretaria de Previdência Social, do INSS e do IBGE.

Estimativas do estudo Devemos unificar as idades de elegibilidade das previdências urbana e rural?, publicado em novembro passado, compararam as sobrevidas (pós-benefício) daqueles que se aposentaram no INSS por idade (excluído tempo de contribuição) a partir dos 65 anos, das clientelas urbana e rural, conforme o sexo.

Um dos autores do estudo, Luiz Henrique Piva escreveu à Agência Brasil que “beneficiários homens da clientela rural parecem viver um pouco mais do que da clientela urbana; beneficiárias mulheres da clientela rural parecem viver um pouco menos do que da clientela urbana. Na média, não há diferença e, nos dois casos, mulheres vivem mais do que homens”.

Vulnerabilidade
Segundo Piva, metade dos homens urbanos viviam além dos 81,3 anos. Já metade dos homens rurais viviam além dos 82,8 anos. Conforme o pesquisador, metade das mulheres urbanas ultrapassa os 87,5 anos. Na área rural, metade das mulheres passava dos 85,8 anos.

De acordo com o autor, os trabalhadores rurais, em termos relativos, “enfrentam situação um pouco pior do que trabalhadores urbanos”. Por exemplo: 77,2% dos trabalhadores homens rurais começaram a trabalhar antes dos 14 anos, contra 43,7% dos trabalhadores urbanos.

Piva pondera que “como a população brasileira é majoritariamente urbana, a maior parte das pessoas vivendo em situação de vulnerabilidade também está em área urbana”. Por exemplo: entre as pessoas que começaram a trabalhar com menos de 14 anos, 46,2% são homens urbanos, contra 17,2% de homens rurais.

“Logo, se o objetivo é que o benefício previdenciário atenda a pessoas em situação de vulnerabilidade, ele não poderia estar voltado exclusivamente para a clientela rural,” argumentou.

Judicialização
Em outro estudo, Previdência Rural no Brasil, publicado em agosto de 2018, o Ipea assinala a maior parte do déficit nominal da Previdência Social (R$ 182,4 bilhões em 2017) tem origem rural (R$ 110,7 bilhões). “Representando aproximadamente 61% do déficit total”, descreve o texto.

Neste estudo é assinalado o número maior de beneficiários (9,3 milhões) que o total da população rural com 55 anos ou mais (6,2 milhões).

De acordo com Leonardo Alves Rangel, diretor de Programa da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, descontando-se as sobreposições entre aposentadorias e pensões, a Previdência Social tem cerca de 8,2 milhões de beneficiários rurais.

Rangel aponta que por trás da diferença pode haver “um problema de fraude”. De acordo com ele, a “aposentadoria rural é um dos benefícios mais judicializados no país. A pessoa não precisa contribuir, precisa comprovar tempo de atividade no campo. E a prova pode ser uma fotografia dela trabalhando, pode ser uma prova testemunhal, pode ser uma declaração de sindicato”.

Cadastro
O diretor de Programa da Secretaria Especial de Previdência acrescenta que “se a prova não está muito concreta, o analista do seguro social não aceita como comprovação de que [o trabalhador] atuou no campo e esse benefício é judicializado. Geralmente, o juiz acaba concedendo o benefício”.

Rangel disse ainda que não é todo sindicato rural que “concede certificado sem conseguir comprovar que o trabalhador a ele filiado de fato exerceu a atividade rural”. Ele lembra que a Medida Provisória nº 871 “organiza melhor o cadastro dos segurados especiais [como os da zona rural] e combate eventuais fraudes”.

O economista Pedro Fernando Nery, autor do livro Reforma da Previdência – Por que o Brasil não pode esperar? também assinala problema de fraude, destaca a edição da MP 871 e calcula que as mudanças na aposentadoria rural podem gerar economia de até 15%. Ele reconhece, no entanto, que “os benefícios rurais são os mais progressivos do ponto de vista da distribuição de renda, inclusive do ponto de vista regional”.

Foto
Júnior César Dias, técnico do Dieese que presta assessoria à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), critica a suposição de que haja fraude na obtenção das aposentadorias rurais. “As aposentadorias resultam de acúmulo histórico de vários anos, e não há obrigação de que as pessoas permaneçam na zona rural após o benefício. Esse fluxo migratório é histórico. A condição de aposentadoria está ligada à atividade e não à moradia rural”.

Segundo ele, o número de aposentados é como um “filme” que registra o acúmulo de benefícios rurais ao longo dos anos, enquanto o número atual de pessoas com mais de 55 anos residente no campo é uma “fotografia” que mostra a atual distribuição da população.

Luiz Henrique Piva, do Ipea, também discorda de que haja fraude na concessão de aposentadorias rurais. “Não interpreto a diferença desses números como sendo necessariamente uma boa evidência de fraude. As pessoas têm mobilidade. É natural que pessoas mais velhas, quando o marido ou a mulher consigam a aposentadoria, alguns continuam trabalhando, mas alguns podem migrar para as cidades para morar mais perto dos seus filhos, que migraram para as cidades para continuar estudos”, acrescenta.

A emenda constitucional sobre a Previdência Social propõe a idade mínima para homens e mulheres trabalhadores da zona rural a partir dos 60 anos, com 20 anos de contribuição. Hoje, a idade mínima é 55 anos para as mulheres e 60 anos para os homens, com 15 anos de tempo de atividade laboral no campo.

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