Por G1 — Brasília
Em uma mensagem de áudio enviada a um caminhoneiro, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, comentou medidas articuladas pelo Palácio do Planalto para atender demandas da categoria que paralisou o país em maio do ano passado e afirmou ao interlocutor que o governo havia dado uma “trava” na Petrobras para evitar reajustes de combustíveis com frequência inferior a 15 dias.
O áudio, revelado pela revista “Veja”, viralizou em grupos de conversas de caminhoneiros em aplicativos de mensagens. Não é possível identificar a data em que a mensagem foi enviada, mas, em entrevista ao jornal “Folha de S.Paulo”, o caminhoneiro Marconi França disse que era o interlocutor do áudio enviado pelo chefe da Casa Civil e informou que a mensagem foi trocada em 27 de março.
“Já demos uma trava na Petrobras. Qualquer modificação de preço, no mínimo entre 15 e 30 dias, não pode ter menos que isso”, declarou Onyx ao caminhoneiro (ouça o áudio), dando a entender que o governo interveio na petroleira.
Ao G1, a assessoria da Casa Civil afirmou que o ministro não vai se manifestar sobre o áudio. A assessoria da Petrobras também foi procurada, mas até a última atualização desta reportagem ainda não havia obtido resposta sobre o conteúdo da gravação.
Em 26 de março, véspera da data em que o ministro enviou a mensagem ao caminhoneiro, a Petrobras informou, em um comunicado ao mercado, que a diretoria da petroleira havia aprovado mudanças na periodicidade de reajuste nos preços do diesel vendido para as refinarias. Na ocasião, os preços passaram a ser reajustados, no mínimo, a cada 15 dias.
Com o fim do governo Michel Temer, a petroleira havia voltado a reajustar os combustíveis em intervalos sem frequência mínima, de acordo com as oscilações do barril de petróleo no mercado internacional e também considerando as varições da cotação do dólar. A mudança ocorreu com o fim do programa de subsídios lançado pelo governo Temer após a greve dos caminhoneiros.
Fiscalização
No áudio, Onyx Lorenzoni também destacou ao interlocutor que o governo iria para cima da fiscalização – sem esclarecer qual seria essa fiscalização.
Segundo o chefe da Casa Civil, o presidente Jair Bolsonaro estava trabalhando para melhorar as condições dos caminhoneiros e, no dia seguinte ao diálogo, tinha programado uma manifestação de apoio à categoria em uma transmissão ao vivo em uma rede social.
“Por outro lado, nós também tamo resolvendo aquela questão dos postos e nós vamos pra cima da fiscalização, tá?”, enfatizou o ministro.
No dia seguinte, 28 de março, Bolsonaro comentou em uma live em uma rede social sobre a fiscalização dos radares eletrônicos instalados na rodovias. Na transmissão pela internet, o presidente também detalhou, entre outros pontos, sobre o cartão caminhoneiro, que permitirá a compra antecipada de até 500 litros de combustível para ser usado durante o trajeto.
“Vamos agora à questão dos caminhoneiros. Antes dizer o seguinte: eu, enquanto pré-candidato, em alguns momentos, estive com os caminhoneiros do Brasil, estive em Gramado, no Rio Grande do Sul, estive também no Rio de Janeiro e aqui em Brasília. Tinha naquele tempo a questão do eixo levantado, que cobravam pedágio. No governo anterior esse assunto foi resolvido. Também uma reclamação na multagem [sic] eletrônica. O que eu acertei com o ministro Tarcísio [Gomes de Freitas, da Infraestrutura]? Nós não queremos mais novos pardais no brasil que visam aí a cobrança eletrônica, cobrança não né, multagem eletrônica, não queremos mais isso.”
Três dias depois, o presidente anunciou a suspensão da instalação de novos pardais nas rodovias federais administradas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit).
“O presidente entrou nisso [reivindicações dos caminhoneiros], tu vai ver que já muitas coisas vão começar a acontecer já nesta semana. O presidente amanhã deve se manifestar pelas redes sociais em direção à categoria dos caminhoneiros, particularmente aos autônomos”, ressaltou na ocasião o chefe da Casa Civil.
Intervenção na Petrobras
troca de mensagens entre Onyx Lorenzoni e o caminhoneiro Marconi França ocorreu duas semanas antes de Bolsonaro intervir para barrar um reajuste de 5,74% que havia sido anunciado pela estatal do petróleo no preço do diesel.
A intervenção do presidente da República na política de preços de combustíveis da petroleira teve forte impacto na bolsa de valores. Por conta do episódio, a Petrobras perdeu R$ 32,4 bilhões em valor de mercado.
Diante da repercussão negativa da intervenção na Petrobras, Bolsonaro foi convencido por auxiliares e aliados a autorizar a retomada da política de reajuste dos combustíveis de acordo com as oscilações do petróleo e do dólar. Na última quarta-feira (17), o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, anunciou uma alta de R$ 0,10 por litro do óleo diesel.
Com o reajuste, o litro do diesel passou a custar R$ 2,2470 nas distribuidoras. O anúncio se deu seis dias após a estatal voltar atrás no último aumento, por determinação do presidente da República.
Em contrapartida à liberação dos reajustes, o governo Bolsonaro anunciou nesta semana uma série de medidas para acalmar os caminhoneiros e tentar afastar a possibilidade de uma nova greve da categoria.
Após negociações do Planalto com caminhoneiros, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) abriu uma linha de crédito a caminhoneiros autônomos de R$ 30 mil para manutenção dos caminhões. O governo também anunciou investimento de R$ 2 bilhões em rodovias.
Em entrevista à GloboNews na última quarta-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou explicar o episódio no qual Bolsonaro interveio na política de preços da Petrobras. Na avaliação do ministro, “é natural” a reação do presidente diante da pressão externa.
O ministro da Economia, que estava em Nova York no dia em que Bolsonaro barrou o aumento do diesel, alega que não houve interferência presidencial na política de preços da Petrobras, embora o próprio presidente da República tenha admitido que confrontou a petroleira sobre o reajuste.
À GloboNews, Paulo Guedes contou que Bolsonaro ligou para o presidente da Petrobras, mas para pedir explicações.
“Ele [Bolsonaro] me disse que ligou pro presidente da Petrobras e disse o seguinte: ‘olha, nos meus cem dias, na minha festa de aniversário, você botou diesel no meu chope. Que negócio é esse? Você podia vir me explicar aqui?’. Em nenhum momento, ele mandou suspender o reajuste ou mandou não dar o reajuste. O presidente da Petrobras é que teve a atenção de dizer: ‘bom, vou explicar pro presidente e depois, jogo que segue’. E foi exatamente isso que aconteceu. Nós nos reunimos, cuidamos um pouco da coisa de caminhoneiros”, justificou Guedes.
“O presidente até dizia o seguinte: ‘poxa, eu não posso nem fazer pergunta que já dizem que estou interferindo em tudo! Eu quero saber o que está acontecendo’. Dito isso, ficou uma lição importante também… Essa necessidade de clareza na comunicação nos preços chave da economia”, complementou.
G1