Por G1
Especialistas de várias universidades brasileiras alertaram contra o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus.
Em nota, eles afirmaram que o governo não pode submeter a população “ao risco adicional de um tratamento sem garantias de segurança e eficácia”. Os cientistas ressaltam, ainda, que “não há evidências científicas favoráveis que sustentem o uso” da cloroquina e da hidroxicloroquina em qualquer estágio da Covid-19.
“Por outro lado”, lembram, “há estudos que demonstram que o uso de CQ/HCQ para o tratamento de Covid-19 pode estar associado à maior frequência de eventos adversos graves e com maior letalidade”, dizem os especialistas.
Eles também afirmam que o uso das substâncias “deve ser restrito a protocolos de pesquisa aprovados por comitês de ética em pesquisa”.
O documento é assinado por médicos e cientistas ligados a institutos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz); à Universidade Federal do Rio de Janeiro; à Academia Nacional de Medicina; à Universidade do Estado do Amazonas; ao Instituto de Ciências Biomédicas da USP e ao Instituto Questão de Ciência, em São Paulo: Celso Ferreira Ramos Filho, Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, Daniel Goldberg Tabak, Djane Clarys Baia-da-Silva, José Gomes Temporão, Marcus Vinícius Guimarães Lacerda, Margareth Pretti Dalcolmo, Mauro Schechter, Natália Pasternak Taschner e Patrícia Brasil.
“As conclusões dos estudos internacionais, multicêntricos e randomizados ora em curso, com previsão de divulgação para algumas semanas, são as únicas garantias de oferta de tratamentos seguros e eficazes a pacientes com COVID-19″, dizem os pesquisadores na nota. ”
“Qualquer tentativa de substituir os resultados dessas pesquisas por análises de estudos observacionais é uma falsa solução, que pode acarretar elevados riscos, incluindo morte, aos pacientes, por efeitos colaterais conhecidos e previsíveis”, alertam.
Eles acrescentam, ainda, que “em uma situação de emergência global de saúde pública, como a pandemia causada pelo SARS-CoV-2, cabe ao Poder Público garantir o bem-estar da população de forma responsável e embasada em conhecimento produzido pela ciência e não a submeter ao risco adicional de um tratamento sem garantias de segurança e eficácia sob a chancela de uma política nacional de saúde”.
Documento
O Ministério da Saúde aprovou, nesta quarta-feira (20), um documento que permite o uso, no SUS, das substâncias para o tratamento da doença, apesar de vários estudos científicos já terem apontado que nenhuma das duas foi eficaz no combate à Covid-19.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) também recomendou, nesta quarta, que os medicamentos só sejam utilizados para tratar doenças contra as quais sua eficácia foi comprovada, como a malária e o lúpus. O braço da entidade nas Américas, a Opas, fez alerta semelhante na terça-feira (19).
A Sociedade Brasileira de Infectologia também alertou contra o uso das substâncias para a Covid-19, afirmando que a aplicação dos medicamentos adquiriu “aspecto político inesperado”.
Saída de ministros
O uso da cloroquina para a Covid-19 vem sendo motivo de discórdia entre especialistas e o presidente Jair Bolsonaro. Apesar de não haver evidências científicas que comprovem a eficácia do medicamento contra a doença, que já matou mais de 18 mil pessoas no Brasil, Bolsonaro defende o uso da substância.
Na semana passada, depois que o então ministro da Saúde, Nelson Teich, alertou sobre os riscos do medicamento, Bolsonaro manteve sua posição sobre o uso dele na pandemia.
Dias após as declarações do presidente, Teich pediu demissão do cargo, menos de um mês depois de assumi-lo. Desde então, o país não tem um ministro da Saúde: o general Eduardo Pazuello ocupa a posição interinamente.
O antecessor de Teich no ministério, Luiz Henrique Mandetta, também havia alertado para os riscos da cloroquina antes de ser demitido. Além do embate sobre o uso da substância, tanto Mandetta quanto Teich tiveram divergências com o presidente sobre as medidas de isolamento social para tentar conter o vírus.